Em sua primeira (e única) visita, Albert Einstein não gostou do Brasil


O Jardim Botânico, bem como a flora de modo geral, supera o sonho das mil e uma noites. Tudo vive e cresce a olhos vistos […] Experiência fantástica! Indescritível abundância de impressões em poucas horas.” 

Bonito, né? Essa poderia ter sido a impressão mais marcante sobre o Brasil para o gênio Albert Einstein. Só que não foi.

Em 1925, o alemão viajou 10 mil quilômetros para fazer uma série de palestras na América do Sul. Com primeira escala no Rio de Janeiro. Aos 46 anos, Einstein já era reconhecido pelo brilho ofuscante da sua capacidade intelectual. Sua Teoria da Relatividade fora comprovada em 1919 (o que lhe conferiu fama global). E já tinha ganhado seu Nobel de Física, o de 1921, pela descoberta do efeito fotoelétrico, que deu origem à física quântica.

No dia 21 de março de 1925, ele desembarcou no Rio de Janeiro para uma escala de um dia antes de seguir para Buenos Aires. Durante as horas em que esteve aqui, visitou o centro da cidade e o Jardim Botânico – que rendeu o tal elogio em seu diário de viagem.

Mas não foi essa boa impressão com nossa natureza que mais o marcou. Depois de passar um mês visitando a Argentina e o Uruguai, ele voltou ao Brasil para mais uma semana no Rio. E aí foi mais perseguido pela imprensa do que artista de novela da Globo. No melhor estilo “Caetano estaciona no Leblon”, um jornal publicou a manchete: “Einstein comeu, ontem, vatapá com pimenta”. 

<span class="hidden">–</span>Leandro Lassmar/Superinteressante

A nota não dizia se o físico gostou do prato. Mas, se depender da impressão geral que Einstein teve do Brasil, a resposta provavelmente é não. Após dias convivendo com o calor carioca, ele escreveu que o Brasil é “quente e úmido demais para se efetuar qualquer trabalho intelectual”. Imagine com vatapá no estômago…

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A gota d’água foi uma palestra ministrada no Clube de Engenharia, no dia 6 de maio. Não cabia mais uma alma dentro do auditório quente e abafado. E, para completar, não eram cientistas que lotavam a sauna improvisada: o público era formado principalmente por militares e políticos com seus cônjuges e filhos. O resultado: Einstein suado enquanto tentava explicar (em francês) conceitos complexos de física para uma plateia de leigos. Tudo isso em meio ao barulho da rua, choro e gritos de crianças.

<span class="hidden">–</span>Domínio público/Wikimedia Commons

Nos dias seguintes, ele ainda fez palestras na Escola Politécnica do Rio de Janeiro e na Academia Brasileira de Ciências (dessa vez, com lotação limitada nos auditórios). Einstein também cumpriu o protocolo de visitas científicas no Rio: Fundação Oswaldo Cruz, Observatório Nacional e Museu Nacional – onde plantou um broto de pau-brasil. O alemão ainda conversou com o presidente da República da época, Arthur Bernardes, e participou de eventos da comunidade judaica brasileira. 

<span class="hidden">–</span>Domínio público/Wikimedia Commons

Einstein era tão famoso quanto Charles Chaplin. Logo, passou a viagem acompanhado não por cientistas, mas por políticos, interessados em bajular a celebridade, e incapazes de debater seus conhecimentos. “As pessoas lá são vazias e pouco interessantes – mais ainda do que as da Europa”, escreveu o pai da Relatividade.

A conclusão da viagem está escrita em uma carta enviada ao melhor amigo, o engenheiro suíço Michele Besso, de junho de 1925: “Foi uma grande agitação sem interesse verdadeiro […] Para achar a Europa estimulante, é preciso visitar a América”. Poxa, Albert ?

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Essa é a terceira parte da matéria “Aventuras (e perrengues) de cinco cientistas no Brasil”. Confira o quarto texto aqui.

Fontes: Livro “Einstein, o viajante da relatividade na América do Sul”, do historiador Alfredo Tolmasquim; Artigo “Einstein e o Brasil”, de Roberto Vergara Caffarelli. Artigo “​​Einstein, A., Besso, M. Correspondance 1903-1955”, de Pierre Speziali.

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